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Sem reforma, juros vão "subir fortemente" de novo, afirma ministro Henrique Meirelles
Na véspera da apresentação do relatório sobre a reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, o governo aumentou a ênfase em torno da urgência das mudanças nas regras previdenciárias. No seminário "Os Caminhos da Reforma da Previdência", promovido pelo Valor, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e dois de seus principais auxiliares usaram um tom dramático para projetar o futuro da Previdência caso não haja reforma. Situações como a da Grécia, que teve de cortar benefícios, e disparada dos juros foram apontadas pelas autoridades como riscos reais caso a reforma não seja levada a cabo.
"Se o país não fizer a reforma no devido tempo, em primeiro lugar as taxas de juros brasileiras, em vez de cair como agora, vão voltar a subir fortemente", disse Meirelles em entrevista coletiva após a fala de abertura do evento. No discurso, ele afirmou que a Previdência é a mais importante reforma em curso e que, se realizada, terá efeito por "várias décadas". O ministro disse que o Brasil é um país de população relativamente jovem, mas que tem gasto com Previdência similar ao de países amadurecidos.
Ele destacou que, puxado pelas despesas previdenciárias, o gasto primário do governo central, como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), aumentou fortemente nas últimas décadas, passando de 10,8% do PIB em 1991 para 19,7% do PIB em 2016. "Temos aqui um crescimento sistemático das despesas primárias, com aceleração forte do último período do governo anterior. Isso traça claramente uma trajetória insustentável".
O ministro disse que os agentes econômicos não esperam a concretização dos fatos, mas agem de forma antecipada e, por isso, o Brasil entrou em recessão e teve queda dramática dos investimentos. "Quando aceleração do gasto foi vista como insustentável, os agentes tomaram postura de defesa", disse. Para ele, o "Brasil está no ponto de fazer reforma sem grandes dramas" e sem retiradas de direitos dos que já usufruem.
Ele ressaltou que a discussão da reforma está mal focada e rebateu o que chamou de "falácias", como o impacto da cobrança de dívidas sobre o desempenho das contas e a tese de que a Previdência e a Seguridade Social não têm déficit.
No ano passado, disse, o déficit da previdência rural foi de R$ 103,4 bilhões e da urbana atingiu R$ 46,3 bilhões, totalizando R$ 150 bilhões. Segundo o ministro, o déficit da Seguridade Social chegou a R$ 258,7 bilhões.
Segundo Meirelles, mesmo que toda a dívida ativa da União fosse cobrada de um dia para outro, uma clara impossibilidade, o problema previdenciário não seria resolvido. Além disso, explicou, mais de 50% da dívida ativa é de empresas falidas e quebradas. Do total, disse, o volume com chances de recebimento é de R$ 50 bilhões.
O presidente nacional da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, disse que é preciso colocar o "dedo na ferida" e melhorar a gestão da cobrança de recursos bilionários da Previdência.
O secretário de Acompanhamento Econômico do ministério da Fazenda, Mansueto Almeida, disse que, mesmo na hipótese de que hoje não houvesse déficit da Previdência, a reforma seria necessária por causa da trajetória do gasto e do rápido envelhecimento da população. Ele destacou que a idade média de aposentadoria no Brasil é muito baixa, em especial os casos de tempo de contribuição, que fica em torno de 54 anos.
Na comparação com outros países e regiões do mundo, o ministro observou que no México, um país emergente como o Brasil, a idade média de aposentadoria é de 72 anos, enquanto aqui é de 59. Na Europa, a taxa de reposição do benefício previdenciário (porcentagem da renda que o beneficiário tinha quando trabalhava) é de 56% e, no Brasil, 76%. "O valor dos benefícios sociais ao idoso no Brasil só é menor que na Bélgica", disse Meirelles, para quem há incentivo à aposentadoria precoce no país.
Mansueto também ressaltou que a reforma é importante para consolidar a trajetória de queda dos juros em curso no Brasil. E também para evitar aumento de tributos, estratégia que, entende, seria prejudicial à competitividade do país.
"Sem isso, todo mundo será prejudicado e alguns poucos beneficiados no curto prazo", disse, ao ressaltar que é injusto o sistema atual, em especial os benefícios que existem para os servidores. Segundo ele, no caso dos servidores federais, o problema não é tanto o tamanho do gasto, que como percentual do PIB está estável em 1,9%. "O problema é o favorecimento da parte mais rica da sociedade."
Segundo ele, o já pequeno espaço para investimento público no Orçamento tem sido consumido pelo explosivo gasto previdenciário e que o aumento dessa despesa tem sido bem mais rápido do que o que se esperava dois ou três anos atrás. Mansueto afirmou que, com o corte orçamentário anunciado há três semanas, os investimentos neste ano cairão ainda mais e continuarão em queda sem a reforma, já que o teto de gasto vai sendo consumido pela Previdência.
O secretário defendeu que a reforma seja igual para todos os estratos de trabalhadores e que seja feita agora. "Não adianta concentrar reformas em poucos grupos, tem que ser geral."
O secretário de Previdência, Marcelo Caetano, destacou que a definição de uma idade mínima de 65 anos para aposentadoria é uma convergência para padrões internacionais e também para os padrões do próprio país, já que quem não tem tempo de contribuição só pode se aposentar nessa idade. Ele observou que, no continente americano, apenas o Brasil e o Equador não adotam idade mínima para aposentadoria.
O presidente da Comissão Especial da Previdência Social, deputado Carlos Marun (PMDB-MS), afirmou que os ajustes na proposta de reforma visam torná-la "razoável" para que seja aprovada pelo Congresso. Segundo ele, as denúncias de corrupção não vão paralisar os parlamentares. "Crime maior seria o parlamento ficar inerte. Estamos mantendo o calendário, cumprindo o nosso papel e que o Judiciário cumpra o dele", disse. "Estou absolutamente consciente que a reforma é necessária", completou.
Apesar da gravidade apontada sobre a necessidade da reforma, o ministro da Fazenda ressaltou que o Brasil dá sinais de retomada do crescimento econômico. Segundo ele, indicadores como IBC-Br, do Banco Central, divulgado ontem e mostrando crescimento de 1,3% em fevereiro, e o aumento na venda de automóveis referendam isso. "Há dados bastante otimistas para o primeiro trimestre deste ano."
Meirelles repetiu que no fim do ano, comparando o último trimestre de 2017 com o de 2016, o crescimento econômico será de 2,7%, entrando 2018 com ritmo de 3%.
Fonte: Jornal Valor Econômico, Edição de 18/04/2017