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Empresas pretendem adaptar contratos de trabalho à reforma
As empresas pretendem fazer alterações nos contratos de trabalho com base na reforma trabalhista, que entra em vigor amanhã. Os principais pontos estão sendo definidos em reuniões com os sindicatos patronais. A construção civil, por exemplo, quer ampliar o uso da terceirização, acabar com o pagamento de horas extras em horários ociosos e adotar a previsão de demissão de comum acordo.
No comércio, pretende-se resolver questões sobre jornada de trabalho aos domingos e feriados. Já a área têxtil planeja reduzir o horário de almoço, implementar a demissão consensual e a homologação anual dos contratos, como forma de evitar novos processos judiciais.
Os sindicatos de trabalhadores, por outro lado, acreditam que tudo ainda deverá ser negociado nas convenções coletivas. E alertam que não devem permitir alterações que prejudiquem o trabalhador. Para a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a implementação vai gerar precarização do trabalho, queda no consumo e mais crise econômica.
Alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), por meio da Lei nº 13.467/2007, consideradas inconstitucionais, ainda deve gerar, segundo as entidades, milhares de ações judiciais de trabalhadores e sindicatos.
O vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Haruo Ishikawa, afirma que a nova lei da terceirização e a reforma trabalhista devem ajudar principalmente a reduzir as ações judiciais que tratam do tema e ampliar seu uso no setor.
De acordo com ele, apesar de o artigo 455 da CLT já admitir o uso da terceirização para a construção e prever a responsabilidade do empreiteiro principal em caso de não pagamento, havia uma grande resistência do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Justiça do Trabalho em aceitar a terceirização em determinadas atividades.
O MPT entrou com diversas ações civis públicas contra o setor com a alegação de que havia terceirização generalizada, sem respeitar a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que proibia a terceirização da atividade-fim (principal) da empresa.
"No setor de construções há uma grande dúvida sobre o que é atividade-fim ou meio porque o produto fica no local e todas as atividades são especializadas, desde a fundação até a colocação de azulejo e de portas. São todas atividades independentes", diz Ishikawa. Com as novas leis, que admitem a terceirização de forma ampla, o vice-presidente entende que o problema estará resolvido.
No caso das horas extras, Ishikawa afirma que não serão mais devidas se o empregado não estiver efetivamente trabalhando. "É comum eles ficarem no canteiro de obra, por exemplo, até a hora dos estudos. E a empresa acabava pagando horas extras. Isso não vai ter mais", diz.
A alteração é fundamentada na inclusão do parágrafo 2º do artigo 4º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esse dispositivo estabelece que não será computado como período extraordinário o período em que o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares.
A construção, por ser um setor de alta rotatividade, também estuda implementar a demissão por acordo entre empregado e empregador, prevista no artigo 484-A da nova lei. Nesse caso, será devido apenas metade do aviso prévio indenizado e da multa rescisória e o trabalhador poderá sacar até 80% do FGTS. Porém, não terá direito a seguro-desemprego.
"Tínhamos muito problemas com empregados que não pedem demissão e empresas que não querem demitir. Agora, devem ser celebrados esses acordos", diz o vice-presidente do Sinduscon-SP.
O uso de premiações e bônus, comum na área, segundo Ishikawa, deve ser estimulado a partir de agora, já que a nova lei deixa claro que não incidem verbas previdenciárias e trabalhistas sobre os pagamentos. Também poderá haver divisão dos períodos de férias pelos trabalhadores, conforme prevê a lei.
Apesar dos planos das empresas do setor, o presidente da Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon-SP), Ramalho da Construção, afirma que não deve permitir retrocessos e que a convenção coletiva não deve ser alterada para prejudicar o trabalhador.
"A Anamatra [Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho] mesmo diz que alguns pontos dessa reforma são inconstitucionais. Ainda vai haver muitos questionamentos na Justiça", diz o presidente do Sintracon-SP.
No comércio, o principal ponto de conflito a ser resolvido envolve os mecanismos de compensação de jornada. Segundo Ivo Dall'Acqua Júnior, vice-presidente da FecomercioSP, com exceção da folga semanal, a compensação de horas de domingos e feriados poderá ser melhor negociada a partir de agora. "A reforma, sem mexer nos direitos, abriu a possibilidade de mecanismos compensatórios mais flexíveis", afirma.
Até então, apesar de ser permitido por lei ao setor o trabalho aos domingos, o funcionário só podia trabalhar três domingos seguidos. No caso das mulheres, a previsão é de um domingo trabalhado e um folgado. O trabalho em feriados tinha que ser tratado em negociação coletiva. "Casar todas essas regras com o descanso semanal era um inferno. A reforma agora possibilita essa transação", afirma.
O setor de turismo, hotelaria e eventos, também atrelados à FecomercioSP, deve começar a adotar o contrato de trabalho intermitente, no qual o funcionário é chamado a trabalhar apenas em períodos determinados. "Isso é muito importante para esses setores que têm mais demandas em determinados períodos", diz Dall'Acqua Júnior.
As empresas da área têxtil têm se interessado basicamente pelos acordos nas demissões, pela homologação de acordos na Justiça e pela quitação anual do contrato de trabalho como forma de evitar novas ações judiciais, segundo o advogado trabalhista e presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Estado de São Paulo (Sinditêxtil-SP),
"Ainda não se sabe como vão funcionar na prática esses acordos judiciais homologados na Justiça. Mas as empresas estão interessadas porque se evita acordo apenas depois de ajuizada uma ação judicial", afirma Pacheco.
Também existe a possibilidade de implantação da redução do horário de almoço, caso seja da vontade dos próprios trabalhadores da área têxtil, segundo Pacheco. Como a jornada é de 44 horas semanais, se houver redução do intervalo, os funcionários podem ir embora mais cedo no sábado.
Ainda que as empresas estejam otimistas com a entrada em vigor da reforma, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, afirma que o cenário deve piorar bastante para o trabalhador. "Deixaremos de ter empregos para fazer bicos", diz.
Para ele, "com a contratação de uma mão de obra menos qualificada teremos produtos de pior qualidade. E com a diminuição de salários teremos uma redução do consumo e um agravamento da crise econômica".
Tudo isso, acrescenta, deve gerar uma grande insegurança jurídica. "Grande parte da Justiça do Trabalho é contra a reforma e sindicatos e trabalhadores vão à Justiça para questionar pontos da nova lei", diz Freitas.
FONTE: Jornal Valor Econômico, Edição de 10 de novembro de 2017.
No comércio, pretende-se resolver questões sobre jornada de trabalho aos domingos e feriados. Já a área têxtil planeja reduzir o horário de almoço, implementar a demissão consensual e a homologação anual dos contratos, como forma de evitar novos processos judiciais.
Os sindicatos de trabalhadores, por outro lado, acreditam que tudo ainda deverá ser negociado nas convenções coletivas. E alertam que não devem permitir alterações que prejudiquem o trabalhador. Para a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a implementação vai gerar precarização do trabalho, queda no consumo e mais crise econômica.
Alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), por meio da Lei nº 13.467/2007, consideradas inconstitucionais, ainda deve gerar, segundo as entidades, milhares de ações judiciais de trabalhadores e sindicatos.
O vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Haruo Ishikawa, afirma que a nova lei da terceirização e a reforma trabalhista devem ajudar principalmente a reduzir as ações judiciais que tratam do tema e ampliar seu uso no setor.
De acordo com ele, apesar de o artigo 455 da CLT já admitir o uso da terceirização para a construção e prever a responsabilidade do empreiteiro principal em caso de não pagamento, havia uma grande resistência do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Justiça do Trabalho em aceitar a terceirização em determinadas atividades.
O MPT entrou com diversas ações civis públicas contra o setor com a alegação de que havia terceirização generalizada, sem respeitar a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que proibia a terceirização da atividade-fim (principal) da empresa.
"No setor de construções há uma grande dúvida sobre o que é atividade-fim ou meio porque o produto fica no local e todas as atividades são especializadas, desde a fundação até a colocação de azulejo e de portas. São todas atividades independentes", diz Ishikawa. Com as novas leis, que admitem a terceirização de forma ampla, o vice-presidente entende que o problema estará resolvido.
No caso das horas extras, Ishikawa afirma que não serão mais devidas se o empregado não estiver efetivamente trabalhando. "É comum eles ficarem no canteiro de obra, por exemplo, até a hora dos estudos. E a empresa acabava pagando horas extras. Isso não vai ter mais", diz.
A alteração é fundamentada na inclusão do parágrafo 2º do artigo 4º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esse dispositivo estabelece que não será computado como período extraordinário o período em que o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares.
A construção, por ser um setor de alta rotatividade, também estuda implementar a demissão por acordo entre empregado e empregador, prevista no artigo 484-A da nova lei. Nesse caso, será devido apenas metade do aviso prévio indenizado e da multa rescisória e o trabalhador poderá sacar até 80% do FGTS. Porém, não terá direito a seguro-desemprego.
"Tínhamos muito problemas com empregados que não pedem demissão e empresas que não querem demitir. Agora, devem ser celebrados esses acordos", diz o vice-presidente do Sinduscon-SP.
O uso de premiações e bônus, comum na área, segundo Ishikawa, deve ser estimulado a partir de agora, já que a nova lei deixa claro que não incidem verbas previdenciárias e trabalhistas sobre os pagamentos. Também poderá haver divisão dos períodos de férias pelos trabalhadores, conforme prevê a lei.
Apesar dos planos das empresas do setor, o presidente da Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon-SP), Ramalho da Construção, afirma que não deve permitir retrocessos e que a convenção coletiva não deve ser alterada para prejudicar o trabalhador.
"A Anamatra [Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho] mesmo diz que alguns pontos dessa reforma são inconstitucionais. Ainda vai haver muitos questionamentos na Justiça", diz o presidente do Sintracon-SP.
No comércio, o principal ponto de conflito a ser resolvido envolve os mecanismos de compensação de jornada. Segundo Ivo Dall'Acqua Júnior, vice-presidente da FecomercioSP, com exceção da folga semanal, a compensação de horas de domingos e feriados poderá ser melhor negociada a partir de agora. "A reforma, sem mexer nos direitos, abriu a possibilidade de mecanismos compensatórios mais flexíveis", afirma.
Até então, apesar de ser permitido por lei ao setor o trabalho aos domingos, o funcionário só podia trabalhar três domingos seguidos. No caso das mulheres, a previsão é de um domingo trabalhado e um folgado. O trabalho em feriados tinha que ser tratado em negociação coletiva. "Casar todas essas regras com o descanso semanal era um inferno. A reforma agora possibilita essa transação", afirma.
O setor de turismo, hotelaria e eventos, também atrelados à FecomercioSP, deve começar a adotar o contrato de trabalho intermitente, no qual o funcionário é chamado a trabalhar apenas em períodos determinados. "Isso é muito importante para esses setores que têm mais demandas em determinados períodos", diz Dall'Acqua Júnior.
As empresas da área têxtil têm se interessado basicamente pelos acordos nas demissões, pela homologação de acordos na Justiça e pela quitação anual do contrato de trabalho como forma de evitar novas ações judiciais, segundo o advogado trabalhista e presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Estado de São Paulo (Sinditêxtil-SP),
"Ainda não se sabe como vão funcionar na prática esses acordos judiciais homologados na Justiça. Mas as empresas estão interessadas porque se evita acordo apenas depois de ajuizada uma ação judicial", afirma Pacheco.
Também existe a possibilidade de implantação da redução do horário de almoço, caso seja da vontade dos próprios trabalhadores da área têxtil, segundo Pacheco. Como a jornada é de 44 horas semanais, se houver redução do intervalo, os funcionários podem ir embora mais cedo no sábado.
Ainda que as empresas estejam otimistas com a entrada em vigor da reforma, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, afirma que o cenário deve piorar bastante para o trabalhador. "Deixaremos de ter empregos para fazer bicos", diz.
Para ele, "com a contratação de uma mão de obra menos qualificada teremos produtos de pior qualidade. E com a diminuição de salários teremos uma redução do consumo e um agravamento da crise econômica".
Tudo isso, acrescenta, deve gerar uma grande insegurança jurídica. "Grande parte da Justiça do Trabalho é contra a reforma e sindicatos e trabalhadores vão à Justiça para questionar pontos da nova lei", diz Freitas.
FONTE: Jornal Valor Econômico, Edição de 10 de novembro de 2017.